Na rede

domingo, novembro 25, 2007

Ainda sobre o IGF-Rio: a relevência está nas pontas

Depois de desabafar a minha frustração pessoal em relação ao IGF no post anterior, fica mais fácil avaliar os aspectos gerais do evento de maneira mais objetiva. É fato que não pude acompanhar os conteúdos, pois estava concentrado em fazer o hack funcionar. Mas ainda assim foi possível captar a movimentação geral, já que fiquei 4 dias internado no Windsor Barra -- ao lado, foto do lobby do hotel durante uma madrugada de trabalho.

Um aspecto destacado por alguns blogs foi a marcante migração das ações relevantes do fórum para os eventos periféricos, como os workshops propostos por grupos organizados, as reuniões das coalizões dinâmicas, os fóruns de melhores práticas e outros. O resultado foi o esvaziamento das sessões principais, que disputavam a atenção dos participantes com até seis agendas simultâneas.

Pior ainda, não há nenhum espaço comum para o processamento das idéias e para a deliberação sobre o que acontece nas pontas do processo. De fato, em função da verdadeira competição por atenção criada pelo agendamento de inúmeros workshops simultâneos às sessões plenárias, a programação dos eventos paralelos atraiu muito mais gente no segundo e terceiro dias. O resultado é um ambiente de 'trade-show' ou de conferência acadêmica. Tal situação gera um sentimento de frustração que pode ser facilmente detectado em inúmeras das partes interessadas. É ótimo, como sugeriu Jeanette Hofmann na sessão final, que os workshops reflitam os interesses reais dos participantes. Mas estes temas fragmentados em processos de livre-associação necessitam algum tipo de integração.
The Rio IGF: The Center Does Not Hold? - IGP Blog
Observações semelhantes foram feitas por Everton Lucero, conselheiro do Itamaraty que foi a meu ver o brasileiro com atuação mais relevante em todo o evento, incluído aí todo o processo preparatório em Genebra e a fase de articulação da presença governamental. Desde as primeiras ações conjuntas, Everton esteve sensível às 'provocações' aportadas pelo MinC para que o IGF não fosse um Forum exclusivo para engenheiros, diplomatas e advogados, o que resultou na criação do blog MinC / MRE para o IGF.

Sua percepção sobre as deficiências do processo, e a resiliência demonstrada ao colocar tais questões de forma clara, tanto no workshop que tratou do cumprimento do mandato do IGF definido em Tunis ('Fulfilling the mandate of IGF') como na plenária que avaliou o desempenho do IGF até agora ('Taking Stock and the Way Forward'), não passaram despercebidas pelos comentaristas atentos.
Um dos panelistas mais provocativos foi Everton Lucero, representante do governo brasileiro que apontou como um dos obstáculos [ao cumprimento do mandato do IGF] a falta de transparência do processo preparatório, o que contraria o parágrafo 33 da Agenda de Tunis. Como ele apontou, o Advisory Group (MAG) não possui procedimentos definidos, e atua com um grau de transparência muito limitado. Lucero também manifestou o sentimento de que o seu 'perspicaz relatório', onde recomendava reformas ao Advisory Group, foi solenemente ignorado. Ele também destacou a ironia na existência de um Fórum que se realiza sob os auspícios das Nações Unidas, mas que ainda assim não é contemplado com nenhum recurso de seu orçamento.
Day 4 of IGF Rio - IGFWatch news

Como bem assinalado pelo FF, uma das repercussões interessantes no ambiente do IGF-Rio foi o post do Joi Ito sobre sua saída do board da ICANN. Ao mesmo tempo em que saúda o trabalho realizado pela instituição e desfaz alguns dos mitos que levam muitos a considerá-la 'o lado escuro da força', assinala também a dificuldade da instituição em escutar os verdadeiros usuários nas pontas da rede.
O problema da ICANN não é de ser injusta, e sim a dificuldade e o tempo requerido para se tentar alcançar consenso nas questões difíceis. O outro problema é que a maioria das pessoas que são afetadas por suas decisões, os usuários em geral, não sabem ou se importam em saber sobre a ICANN e seu papel. Descobrir a melhor forma de captar os inputs destes usuários tem sido um questão recorrente, mas isto não é um problema da ICANN unicamente. Toda a política e o universo da ação coletiva compartilham esta dificuldade de fazer com que o público se importe com o debate sobre os temas que o afetam diretamente.
Three Years with ICANN - Joi Ito
Minha tendência é concordar com o Joi Ito duplamente. Sempre achei um exagero esta ênfase total na internacionalização da ICANN como a grande questão da governança da rede. O fato é que uma das principais reivindicações do IGF-Atenas -- domínios top-level funcionando em códigos de caracteres internacionais além do hoje mandatário alfabeto romano -- parece estar recebendo tratamento diferenciado por parte da ICANN. Pode até parecer um detalhe, mas trata-se neste momento da iniciativa mais relevante no sentido de proteger a internet dos riscos de fragmentação.
Se a ICANN estiver em condições de dar suporte a domínios top-level em chinês, arábico, persa e outras línguas, isto pode significar um passo fundamental no sentido de aplainar arestas, com alcance suficiente para prevenir um quadro de ruptura dramática onde não poderíamos mais estar falando de "a Internet".... seria um mundo onde a competição entre nameservers de diferentes nações nos deixaria falando sobre diversas "Internets".
Icann takes a very big small step - My Heart's in Accra
Enfim, fico com a impressão de que o rescaldo sobre o IGF-Rio ainda pode render boas reflexões*. Em linhas gerais, penso ser lastimável que um processo que se propõe a debater a governança da Internet faça um uso tão pobre dos recursos da própria rede, a começar pelo site oficial(!).

O IGF deveria privilegiar a interação em rede, retirando a ênfase no encontro presencial anual -- uma ostentação ridícula -- e ativando uma permanente colaboração online. Mas enquanto o custo de um coffe-break básico do IGF-Rio pode significar a sustentabilidade de um servidor web ativo na rede por um ano -- ou, quem sabe, uma tela extra para a projeção da participação remota no salão do evento, a coalizão dinâmica de colaboração online (OCDC) teve a sua página wiki desativada por depender do bolso de um de seus membros para se manter online.

Como última observação, confesso que fiquei espantado com a falta de visão de alguns dos nossos colegas, Skywalkers tardios e demodês que ainda acreditam na relevância dos fóruns restritos com seus bastidores mesquinhos. Perderam a oportunidade de se plugar na dinâmica e diversa cultura de uso da rede, que emerge a cada dia de suas pontas. Este é, a meu ver, o verdadeiro tema, objeto e finalidade de qualquer projeto internacional de governança da Internet.

Foto de Vitor Cheregati: Papo sobre internet, governança, propriedade intelectual, desenvolvimento e futuros possíveis durante o IGF Paralelo, no Circo Voador, Lapa, Rio de Janeiro. Presentes os Ministros de Estado Gilberto Gil e Mangabeira Unger, o Vice-Governador do Estado do Rio Luiz Pezão, Ronaldo Lemos do iSummit e FGV, moderados pelo animador de políticas digitais do MinC, o legendário Claudio Prado.

(*) O conteúdo de vídeo das 'main sessions' do IGF-Rio tem alguns bons trechos que mereciam destaque. Se alguém tiver a manha de baixar os arquivos, entro na colaboração para fazer uma edição legal para colocar no youtube. Interessados podem se manifestar nos comentários. Alô turma do Circo...

sábado, novembro 24, 2007

Hackeando o IGF-Rio, ou quase...

Já se passaram 10 dias desde o encerramento do Internet Governance Forum (IGF) no Rio de Janeiro, e somente agora tenho a oportunidade de refletir um pouco sobre o que se passou. Devo dizer que ao cabo do processo, meus sentimentos ficaram registrados de forma oficial e pública no relato do Jeremy Malcolm, fundador e principal ativista da Online Collaboration Dynamic Coalition (OCDC), proferido na sessão de relatório no último dia do IGF.

(José Murilo Junior) spoke in the meeting [the OCDC workshop] about a tool that he had developed with the Brazilian ministry of culture for the Rio IGF meeting. It combines chat and webcasting and as well as being used by remote participants is designed to [allow participants present at the meeting to be able to view, on a large projection screen] [be used by participants at the meeting] the comments that are being made by remote participants in realtime. For the purpose of the IGF meeting, Jose and his team also developed an interface to allow what people in the auditorium see to be monitored to filter out inappropriate remarks. He was disappointed that this was not used in the Rio meeting.
Reporting Back Session, 15 /11/2007 - The Internet Governance Forum (IGF)

O interessante é que um trecho do relato do Jeremy (assinalado em vermelho), cuja íntegra foi compartilhada com os membros da coalizão dinâmica, foi extirpado da versão oficial disponível no site oficial do IGF, e em seu lugar figura o trecho marcado de cinza -- o que chega inclusive a comprometer a compreensão da frase. Uma censura estratégica, diria eu.

Este post deve estar parecendo linguagem cifrada, não é? Na verdade ele se explica através destes posts aqui (este também), que detalham melhor a minha participação no processo IGF -- o Fórum de governança da Internet da ONU -- como representante do Ministério da Cultura.

No MinC de Gilberto Gil, a rede internet é considerada extra-oficialmente como patrimônio imaterial da cultura contemporânea, e como tal, sujeita à proteção contra os perigos que ameaçam a plena fruição de suas possibilidades de difusão e acesso à cultura e ao conhecimento. Neste sentido, por ocasião da realização do IGF no Rio, entendemos que a colaboração do MinC deveria contemplar a aproximação dos temas debatidos no Fórum com o mundo da cultura, e ao mesmo tempo viabilizar um canal de retorno desta dimensão cultural de volta para o Fórum, utilizando as possibilidades de comunicação disponíveis na rede.

Para isso, o Circo Voador na Lapa foi mobilizado durante os 3 dias principais do IGF, cumprindo programação de debates com convidados que estariam interagindo diretamente com as sessões plenárias. O modelo de participação remota proposto pelo MinC para o Secretariado do IGF foi o mesmo utilizado no Seminário Internacional de Diversidade Cultural, e permitiria a interatividade do público online com a audiência 'privilegiada' no local do evento, o hotel Windsor na Barra. Tudo isso acompanhado pelo blog MinC/MRE para o evento.

Nossa percepção era a de que o IGF, ao se apresentar como experiência inovadora da ONU em reunir para o debate um fórum 'multi-stakeholder' (que abrange representantes de governos, das empresas e da sociedade civil), teria como diretriz necessária promover o alargamento do debate e facilitar a participação de todos os públicos interessados. No primeiro IGF em Atenas o esforço em oferecer um nível básico de participação remota foi, em minha opinião, fundamental para a caracterização do que veio a ser chamado processo IGF, o qual prevê mais 3 reuniões até 2010.

Enfim, o plano -- que parecia bom -- de proporcionar ao público interessado um meio de participação remota através de uma interface de chat / webcast, e ao mesmo tempo projetar o fluxo de comentários e perguntas do chat diretamente em uma tela no salão do evento, foi inviabilizado por motivos que até agora eu tento definir. Depois de tudo aprovado, combinado, ensaiado e configurado, o 'pulo do gato' que era a projeção da 'desconferência'* no salão do evento, não aconteceu. E eu, sentado aí gerenciando o chat e com a tela pronta para entrar no ar (foto), amarguei uma grande frustração**.

Acredito hoje ter sido ingênuo em imaginar que um processo com tanta interferência política e não-transparente como o conduzido pelo MAG (Multistakeholder Advisory Group) na definição dos panelistas, poderia ser 'hackeado' tão facilmente. Afinal, colocar o internauta comum -- 'você' mesmo aí no seu humilde teclado -- na posição de se manifestar em condições análogas àquela turma acostumada a intermediar interesses institucionais em meio a processos representativos típicos do século passado, é sem dúvida uma hackeada radical no sistema***.

Não foi à toa que a galera que cuidava da arte que iria ilustrar o evento no Circo voador 'captou a mensagem', e mandou ver o recado -- 'hackeando a onu' -- na primeira versão do cartaz (ao lado) -- censurada por excesso de sinceridade.

Ao final, depois de tanto esforço nos últimos 2 meses para 'abrir' o tema da governança da internet para um público mais amplo, para mim sobrou uma incômoda sensação de fracasso. Minha impressão foi a de que chegamos bem perto de fazer funcionar um hack brilhante, que poderia trazer participações inusitadas para o IGF, mas um 'bug' de última hora pôs tudo a perder. O aprendizado, este sim, foi inestimável.

(*) 'desconferência' (unconference ) - parte da premissa de que na audiência pode / deve existir pessoas mais interessantes para a qualidade do debate do que a suposta autoridade do conferencista.
(**) Ainda acho que o plano teria funcionado se tivéssemos conseguido uma tela exclusiva para a projeção do chat da participação remota, e não dependêssemos do maldito 'switch' que jamais foi acionado. Ficamos reféns de condições subjetivas tais como o grau de arrojo e ousadia das pessoas do Secretariado do IGF responsáveis pelas decisões operacionais.
(***) Hackear: trata-se de descobrir como funciona o processo para então customizá-lo de acordo como queremos, em sintonia com interesses coletivos. Como diz o Ministro Gil, "Hackers resolvem problemas e compartilham saber e informação. Acreditam na liberdade e na ajuda mútua voluntária"

quarta-feira, novembro 07, 2007

Rising Voices: Novamente Chamando as Vozes Emergentes...

Meu amigo David Sasaki está novamente ativando uma chamada de micro-financiamento para projetos de mídia comunitária através do programa 'Rising Voices'. Trata-se de uma iniciativa da organização Global Voices, na qual me orgulho em atuar como colaborador.

O 'Rising Voices' (Vozes Emergentes) tem como principal objetivo ajudar a trazer novas vozes de novas comunidades e diferentes idiomas para a grande conversação na rede, por meio de recursos e fundos para grupos locais que apresentem propostas de como alcançar comunidades que ainda não possuem representação na web. Exemplos de potenciais projetos incluem:

  • Compra de uma boa câmera digital de vídeo e ensino de um grupo de estudantes rurais a produzir um videoblog documentário sobre a vida de seus avós.
  • Organizar uma oficina regular sobre blogs e fotografias em orfanatos locais. Parte do recurso financeiro pode ser utilizado em câmeras baratas e acesso à internet para que os participantes possam descrever a vizinhança para o público mundial com textos e imagens.
  • Trabalhar com uma organização não governamental (ong) local ou ativista social para que os desafios, sucessos e histórias desses grupos possam circular em uma audiência global.
  • Traduzir nosso material sobre novas mídias para idiomas indígenas, como o Quechua ou Wolof, que não estão representados na blogosfera ou podosfera atual. Depois utilizar os módulos de ensino para encorajar blogueiros a postar nos idiomas de origem.
Os recursos variam entre US$ 1 mil e US$ 5 mil, . Na primeira chamada, em julho, cinco projetos escolhidos entre 142 aplicações de 60 países foram contemplados. Nenhum do Brasil.

Veja no site do Global Voices em Português o que você precisa fazer para se inscrever e fique de olho no prazo, que vai até 30 de novembro. Como diz o David, "o céu é o limite, mas os recursos, infelizmente, não". As verbas do programa de promoção do Rising Voices, em reais, variam entre R$ 1.700 e R$8.500, e portanto a dica para a apresentação da proposta é que você "seja o mais sério, específico e realista possível quando descrever os gastos previstos no projeto".

Os projetos que tiverem êxitos serão destacados no Global Voices, e isto pode ter um grande significado para as comunidades atendidas. Vale à pena participar!

terça-feira, novembro 06, 2007

Open Google. Será?


Voltando rapidamente a este blog
deveras abandonado, tenho que atualizar os poucos insistentes leitores nas novidades da última semana, que causaram 'marolas significativas' no ambiente digital. Duas delas paridas pelo gigante Google: o lançamento da plataforma 'Open Social',
onde o 'conceito é ter um único padrão de produzir programas e extensões para várias redes sociais'; e o anúncio da 'Open Handset Alliance' powered by 'Android': uma plataforma open source de desenvolvimento para celulares baseada na licença Apache 2, OS Linux, e linguagem Java, e que já conta com Motorola, NTT DoCoMo e Telecom Italia entre os 30 parceiros iniciais.

O timing desta avalanche mercadológica do Google baseada no conceito 'open' até parece ser uma reação desproporcional ao sucesso do Facebook, e para os desenvolvedores será necessário aguardar um pouco mais para descobrir o real valor das iniciativas. Ao mesmo tempo em que é interessante ver o conceito 'open' ser promovido pelo maior player da rede, cada vez mais temos a impressão de que o Google se abre com o único objetivo de engolir-nos a todos em seu gigantesco silo colorido.

De fato, alguns comentaristas destacam que o gigante da web promove o conceito 'open' somente quando conveniente, e geralmente em setores nos quais se encontra em desvantagem competitiva. No âmbito das máquinas de busca por exemplo, onde o reinado do Google se baseia em sua capacidade aparentemente infinita de escalar seu index de conteúdos da web, porque não lançar uma 'Open Index Alliance'?

Aposto 1 contra 100 como esta iniciativa não vai partir do Google. Entretanto, vale à pena acompanhar
o projeto de 'open search' que surgiu do encontro de Jeremie Miller , o pai do Jabber e do protocolo XMPP, com Jimmy 'Wikipedia' Wales e seu novo projeto comunitário, o Wikia. O Wikia Search pretende tornar a busca uma parte da infraestrutura da web baseada no protocolo aberto Atlas: ao invés de um sistema monolítico (o silo Google), uma ação integrada de várias entidades independentes que irão desempenhar diferentes papéis, tornando a busca na rede o resultado de uma infraestrutura global totalmente distribuída e interoperável. Sobre este assunto, vale explorar o conceito de 'Economia do Significado' ('The Meaning Economy') desenvolvido pelo Jeremie Miller em seu blog:

O futuro da busca está na cooperação (e competição) abertas baseada na 'Economia do Significado' - criar significados, negociar significados, servir significados. Minha visão se inicia com um protocolo aberto, que permita a redes independentes que realizam funções de busca (pesquisa, indexação, ranking, hospedagem, etc) compartilhar e interoperar. Todas as relações entre estas redes são sempre absolutamente transparentes e abertamente publicadas. Redes trocam conhecimento entre si, cada uma adicionando novos significados à informação, cada uma delas responsável pelas reputações de seus participantes e pares. Este é o verdadeiro fundamento da 'Economia do Significado'. O 'amanhã' tem um significado que todos nós podemos ajudar a construir.
The Meaning Economy - Temporally Relevant
Outra área na qual o Google não demonstra qualquer abertura é em sua estratégia de digitalização e disponibilização do conteúdo de bibliotecas (Book Search). Em contraste com as iniciativas da Open Content Alliance, que promete acesso público irrestrito ao conteúdo e informações digitalizados, a empresa que costumava se gabar de 'não ser do mal' ('Google is not evil') parece tentar se colocar como o único lugar na rede onde tais conteúdos podem ser encontrados -- a única biblioteca, o único acesso. Brewster Khale, do Internet Archive, alerta que a possibilidade do controle sobre a biblioteca do conhecimento humano por parte de uma só empresa pode se tornar um pesadelo.

Querem outra dimensão absolutamente opaca do Google? Os programas AdWords e AdSense -- sua galinha dos ovos de ouro. Concordo com o argumento de que a empresa não tem nenhuma obrigação de compartilhar seus segredos estratégicos, mas a falta de transparência destes serviços são credenciais negativas para qualquer aspirante à promotor da tendência 'open' na rede. Afinal, o custo de um 'adword' pode variar muito de acordo com o misterioso 'score de qualidade', e um simples ajuste no algoritmo pode fazer com que estratégias de AdWords que funcionaram por anos se transformem subitamente em totais fracassos.

Também o AdSense está longe de ser um mercado aberto ('open') onde veículos podem definir o seu preço para expor anúncios em suas páginas, e ao mesmo tempo acompanhar quantos anunciantes estão interessados em pagar pelo serviço. Enquanto ficamos todos a especular sobre volumes e valores, só Deus sabe a parte que cabe ao Google nesta equação. O fato do valor da ação da empresa bater a casa dos 700 dólares nos últimos dias tem o efeito de tornar nossas adivinhações sobre o tema em fantasias estratosféricas. Seria o Google a nova Microsoft?

Em síntese, não há como negar a importância do Google para o movimento Open Source. A empresa não nega em momento algum que a base de seu sucesso é a plataforma Linux, e recentemente se juntou à 'Open Invention Network', uma inovadora organização para compartilhamento de patentes criada com o objetivo de fomentar um ambiente legalmente protegido para todos aqueles que utilizam Linux.

Também não podemos esquecer iniciativas como o Summer of Code, ou o apoio a eventos como o Ubuntu Developer Summit e o Linux Foundation Innovation Summit. Mas é importante perceber que as principais iniciativas 'open' do Google acontecem porque configuram-se como boas opções para os negócios da empresa, e não porque obedecem a qualquer princípio institucional ou filosófico. Que acham vocês?