Na rede

sexta-feira, março 30, 2007

SaferNet, Governança da Internet, e .XXX

O evento em Campinas foi bem interessante, principalmente pela troca de idéias com meus colegas panelistas Thiago Tavares, da SaferNet, e João Tranchesi, da Abranet. Não pude deixar de insistir para que o Thiago nos brinde com um blog onde possa compartilhar com a rede suas movimentações e observações no sentido de tornar a Internet um local mais seguro. Fiquei bem satisfeito em tê-lo como ponta de lança desta ação absolutamente necessária de dotar os usuários da rede com ferramentas ágeis que possam corrigir de forma razoavelmente segura as distorções engendradas pelo ambiente coletivo da rede.

"Onde há sociedade, há crime": foi com esta citação de Durkheim que o Thiago iniciou sua apresentação, o que para mim diz muito sobre os conceitos que norteiam a atuação da SaferNet. Ou seja, parte do princípio de que os crimes na rede são fruto esperado da convivência humana, e que tais ocorrências não podem ser utilizadas como justificativas para a redução das liberdades que fizeram da Internet este formidável espaço de compartilhamento de recursos para a sociedade global. Não foi obra do acaso que o Thiago tenha sido uma das principais vozes contra a famigerada 'Lei Azeredo', que segundo ele está sendo preparada para 'voltar' com apoio total da FEBRABAN. Portanto, Thiago, estamos todos esperando pelo seu blog para ser nossa referência nesta importante frente na batalha pela Ecologia Digital.

Outra informação interessante que captei com o Thiago foi sobre um processo contra o Google por causa da comunidade 'Bregas Assumidos' do Orkut, movido no ano passado pela socialite Yara Baumgart. A digníssima senhora teria se ofendido por ter seu nome associado a uma comunidade 'brega'. Em raro e extremo gesto de complacência o Google diligentemente forneceu, neste caso, os IPs dos fundadores da citada comunidade para a 'brega', digo, para a socialite ofendida. A pergunta que fica é: como se justifica que, alguns meses depois, o Google se recuse a ter o mesmo procedimento para casos comprovados de atividades ligadas à pedofilia?

18/04/2006 - A Google Brasil Internet Ltda. fornece à Justiça Estadual do Estado de São Paulo todas as informações relativas aos usuários que criaram perfis falsos de uma conhecida socialite paulistana que foi caluniada e difamada no Orkut, e teve o seu nome indevidamente inscrito numa comunidade chamada "Bregas Assumidos". Esse caso é a prova definitiva e irrefutável que a empresa Google Brasil tem todas as condições de colaborar com a Justiça Brasileira e cumprir as ordens judiciais a ela endereçadas. Leia uma parte do processo público, arquivado na 38 Vara Cível da Comarca do Estado de São Paulo.
Crimes do Orkut Timeline - SaferNet.org

VEJA TAMBÉM: Saiba como foi o 3º Simpósio Regional de Inclusão Digital - CDI / Campinas

O painel "Governança e Direitos Humanos (Quem é o dono da Internet?)" (no simpósio do CDI) foi uma boa oportunidade para falar um pouco sobre como foi o IGF em Atenas, e sobre a boa possibilidade que representa a realização do IGF 2007 no Rio de Janeiro em novembro (apresentação em pdf). Pude perceber que os interlocutores tradicionais do debate sobre a governança da Internet no Brasil, de uma forma geral, consideram o formato proposto para o IGF como um problema, já que o evento não se propõe a apresentar decisões ou recomendações em seu encerramento.

Eu, particularmente, acredito que o formato geral proposto para o processo IGF -- fórum aberto, heterogêneo e não hierarquizado, debate sobre os impasses da WSIS em pé de igualdade, livre troca de informação e conhecimento, ampla representação, propostas de participação online, coalizões dinâmicas e (principalmente) o aspecto não decisório -- ainda é o ideal para o debate que se faz necessário no âmbito da Internet global. Estive no IGF em Atenas representando o Min. Gil e o Ministério da Cultura, mas não pude abandonar a perspectiva de blogueiro que carrego sempre comigo, e por este ângulo pude perceber que alcançaremos mais e melhores resultados tanto mais consigamos alargar o alcance das várias linhas de ação e debate propostas pelo fórum.

Portanto sem querer polemizar sobre as propostas que outros setores estão preparando para o IGF, estarei divulgando e defendendo a proposta original e pretendo estar atualizando as informações pertinentes na seção IGF do setor de Cultura Digital no site do MinC. É importante desde já estar acompanhando as 'coalizões dinâmicas' em andamento, e sobre o tema estarei postando um informativo em breve.

Um outro assunto deste post, ainda na esfera da governança da Internet, é o recente veto da ICANN ao domínio .XXX. Como bem colocado pelo Joi Ito, não é atribuição da ICANN determinar se um conteúdo específico é apropriado ou não, e portanto a decisão cria um precedente estranho. Instituído como um conselho, os membros da ICANN não podem atuar como se fossem representantes 'eleitos' pela comunidade global da Internet. Na medida em que a aplicação para implementação do domínio .XXX não apresenta nenhum problema de ordem técnica para a rede, o 'Board' não tem nenhuma base para justificar o seu veto.

São tais distorções na compreensão do significado de Governança da Internet que me fazem acreditar no processo do IGF como uma boa proposta para o futuro. Precisamos urgentemente alargar o debate, e o Brasil tem papel importante nesta parada.