Na rede

terça-feira, junho 28, 2005

Os juízes americanos querem matar o p2p
- o que temos nós com isso?

Para muitos de nós hoje é dia de lamentar a decisão da Suprema Corte americana dando vitória aos estúdios de hollywood no processo contra os desenvolvedores de aplicativos p2p para compartilhamento de arquivos, que diz basicamente o seguinte: os estúdios MGM podem processar a Grokster Co. se suas redes forem comprovadamente utilizadas para roubar música, filmes e outros conteúdos protegidos -- e houver evidência de intenções ilegais por parte dos desenvolvedores do software (esta parte da decisão é importante para entender a estratégia dos juízes). Para os criadores de tecnologia, e para os grupos de defesa dos usuários, esta é uma decisão que irá congelar a inovação e resultar em inúmeros processos legais análogos por parte das grandes corporações ('gargalos') de mídia para 'matar' novas idéias e possibilidades tecnológicas.

"Esta decisão dá aos detentores de conteúdo um tremendo poder de ditar o tipo de tecnologia que será permitida aos consumidores utilizar." declarou Jason Schutz, da EFF, na Wired.
Uma observação menos apaixonada da decisão, sugerida por John Palfrey, indica que os Juízes supremos deram uma tacada corporativista, ao mesmo tempo em que agradaram -- de certa forma -- os big players de ambas as partes (indústria dos entretenimento x indústria tecnológica). Os grandes da tecnologia tinham medo de ver revertida a decisão de 1989 do caso Sony, que foi mantida, e podem agora dormir tranquilos. Apenas terão que se perguntar, de agora em diante, se ao distribuir uma nova tecnologia estão agindo de forma razoável no que diz respeito à mensagem passada aos usuários sobre as possibilidades daquela inovação. Ou seja, advogados bem remunerados serão necessários para sabermos: será que o meu modelo de negócio induz terceiros a violar direitos autorais? que tipo de publicidade pode me causar problema? que fazer para impedir usos ilegais de minha tecnologia? Como diz o Lessig, sempre os advogados! Para os big players, com suas margens de lucro gordurosas nos mercados globais, contratar mais advogados não faz muita diferença -- afinal são cidadãos americanos que precisam trabalhar... Ou seja, uma grande decisão, onde todos (principalmente os advogados) saem felizes.

A notícia deu até no Jornal Nacional - uma chamada incompreensível (!) para quem não acompanha o assunto, mas um sinal de como o tema é caro nas trincheiras da 'big mídia' por aqui. De nossa parte, seguimos empunhando a bandeira da Ecologia Digital contra a influência das corporações, dos advogados, e de governos inescrupulosos no ambiente da rede. Sabemos que nossos garotos vão continuar inventando possibilidades neste ambiente open source tupiniquim, e certamente não terão que contratar os tais advogados para descobrirem se estão mal-intencionados -- pelo menos por enquanto. De fato, não vejo razão para que o Brasil coopere com a aplicação de leis que não condizem com o nosso contexto de desenvolvimento e com nossas interpretações e escolhas. Diante de tudo isso, parece que Richard Florida tem razão em seu livro 'The flight of the creative class', onde prevê que os EUA estão avançados no processo de deixar de ser o principal centro de inovação tecnológica no mundo. Por mim, tô nem aí.

Scoble tem ótimos links no tema, e vale conferir o debate interativo no WSJ.

update 28/06: Veja também Siva Vaidhyanathan na Salon; Mike Godwin na Reason; e também Mark Cuban; uma síntese geral da reação na blogosfera pelo Eric Goldmann; e a avaliação pós resultado do Fred von Lohmann (EFF).