Na rede

domingo, fevereiro 22, 2004

O defeito do mercado no setor de mídia
- Qual o preço do remendo?

Um artigo ("Market
failure in the media sector
") do economista Eli
Noam
no Financial Times desta última
semana chamou a atenção da blogosfera e rendeu comentários
interessantes. O texto começa de forma bombástica:



"Quando os líderes das empresas de mídia, telecomunicações,
TI e Internet se encontram, como fizeram recentemente em Davo, a conversa
é animada sobre novas realizações, mas ofuscada pelos
revéses: a "bolha" das dotcom, o "crash" das telecom,
a explosão da indústria da música, a queda de anúncios,
a estagnação no setor de e-publishing, a desaceleração
do PC, a saturação do wireless, o fiasco dos semicondutores,
a crise dos jornais e a recessão em P&D. A pergunta é: qual
o motivo destes acontecimentos varrerem o setor de informação
tão regularmente?"



Noam explica que um defeito do mercado ocorre quando os preços não
conseguem manter um equilíbrio auto-sustentável, e afirma que
o defeito do setor de informação é uma tendência
que deverá trazer efeitos de longo alcance e prazo. O problema não
estaria na falta de demanda ou investimento, mas no excesso de oferta, competição
e na deflação estrutural dos preços. Mas o economista vai
mais longe:



"Se este é o caso, quais as implicações em
termos de políticas? Ações voluntaristas como o movimento
de software livre, informação compartilhada, ou pontos públicos
de acesso wireless não irão resolver o problema porque tais
iniciativas, também, estão sujeitas à instabilidade conhecida
como "a tragédia dos comuns", na qual a liberdade de uso
e a sobre utilização destroem o esforço comunitário."



Jarvis
e Mayfield
comentaram o artigo. E Werbach
afirma que a resposta da tecnologia à questão chama-se: sindicação



"Sindicação é a venda do mesmo
bem a muitos clientes - pelo fato da informação nunca ser "consumida",
um número infinito de pessoas pode usar a mesma informação...
Repare a performance das duas empresas mais calcadas no modelo syndication:
Amazon e Google.
Um bom teste do cenário para o modelo syndication será o desenvolvimento
do ecossistema RSS
/ RDF / Atom
em torno dos blogs".



Talvez o que Noam e outros economistas não levem em conta é que
o esforço comunitário hoje tem muito mais alcance do que sempre
teve, exatamente pelo compartilhamento do capital itelectual possibilitado pela
tecnologia digtal e pela conectividade. Outro aspecto desconsiderado é
a variável ecológica, que tem a capacidade de gerar questionamentos
nos grupos humanos sobre a necessidade de novos modelos econômicos que
possam significar desenvolvimento sustentável e paz. Tais movimentos
podem chegar à conclusão que é possível alcançar
maior qualidade de vida deixando de lucrar "tanto quanto possível"
em todas as instâncias.


UPDATE (11/03): Eli Noam se
manifesta aos blogs
. Veja também um texto mais antigo dele: "The
web is bad for democracy
"

.... enquanto isso, no Brasil

A revista Época
(leia-se organizações globo, presente em todos os ramos acima
citados) aparece com um vídeo denunciando um caso de corrupção
acontecido em 2002. É sabido que a Globo e os outros oligarcas da mídia
estão com o pires na mão, à mercê da ajuda governamental,
e que José Dirceu tem estado por trás de decisões firmes
que contrariam interesses poderosos. Portanto, não é difícil
imaginar que a jogada ensaiada tem objetivos bem definidos.



"Se os responsáveis pela gravação estavam interessados
em combater a corrupção não poderiam esperar dois anos.
O ocultamento no caso é indício de cumplicidade. Está
evidente que a liberação do vídeo obedeceu a um preciso
timing político: coincidiu com o pior momento do governo Lula e com
o desgaste do ministro-chefe da Casa Civil"

Alberto
Dines - Observatório da Imprensa



O que significa hoje remover José Dirceu de sua posição?
Observando a questão daqui do mirante da Ecologia Digital, está
claro que significaria a interrupção do maior e mais ambicioso
projeto de migração para software livre em implementação
hoje no mundo. Um projeto que, uma vez bem sucedido, comprovará a viabilidade
do modelo para o terceiro mundo, estabelecendo bases sólidas para uma
economia mundial baseada no compartilhamento do capital intelectual. Costumo
dizer que esta ação é a mais significativa de todo o governo
Lula até agora.


E o que o dinossauro Microsoft
tem a ver com isso? Bill
tem bilhões em recursos para oferecer à mídia, e bilhões
à perder com a permanência de Dirceu em seu status atual. Enquanto
isso, o governo cobre buracos no orçamento e patina para emplacar seus
programas sociais. Dinheiro para a Globo? Talvez não tenha. Que tal uma
troca estratégica?


Delírios? Estejamos atentos.

sexta-feira, fevereiro 13, 2004

O cerco se fecha...- Reunião do Comitê de Implementação de Software Livre no Governo Federal

Foi nesta sexta-feira treze, dia em que finalmente parou de chover em Brasília após dilúvios sem fim, que Sérgio Amadeu (Diretor-Presidente do ITI/PR) e sua turma (cada vez maior e mais eclética) ocuparam o auditório do Ministério da Saúde para mais uma rodada de atualização e troca de informações sobre o andamento da implementação do software livre no governo federal.

Carlinhos Cecconi, o chefe de gabinete, fotógrafo, mestre de cerimônias, contra-regra, e etc., apresentou os novos sites que viabilizarão a estratégia:

  • o Colaborar - ambiente apropriado para o desenvolvimento colaborativo de códigos
    em software livre (baseado no GForge), que seria o "elo de ligação entre desenvolvedores, gestores públicos, organizações públicas e sociedade, e reúne informações de interesse dessa comunidade"; e

  • o Interagir - plataforma de escrita colaborativa (em Twiki) que implementa um gerenciador de documentação, base de conhecimento, grupo de discussão, e espaço para o debate e desenvolvimento de projetos.

Cecconi também apresentou as licenças traduzidas CC-GNU GPL e CC-GNU LGPL (Menor) desenvolvidas em parceria com a Creative Commons de Lawerence Lessig. Isto significa que o Brasil é o primeiro país a traduzir a GPL para implementação efetiva e válida em território nacional. Sérgio Amadeu ressaltou a importância dos desenvolvedores já começarem a utilizar a licença mediante registro, principalmente neste início de processo, para garantir, fortalecer e divulgar a proposta.

Entre apresentações sobre o desenvolvimento de um kernel seguro
(auditado) para as distros (de governo ou não) pela ABIN (junto com a GSI e o ITI), e relatos sobre processos de migração total para software livre
nos ministérios, ainda houve tempo para Claudio ("sem tesão não há inclusão") Prado (MinC)
dar o recado cultural:

"...tudo começou com um hippie maluco que ficou puto com um código fechado que não lhe atendia, e que resolveu criar toda essa bendita confusão. Imaginem, um hippie derrubando o homem mais rico do mundo! (Bill?!)"

E a revolução não fica só na esplanada (é também é nas pontas): Amadeu apresentou vídeo significativo que documenta uma visita a Solenópoles (CE), cidade onde atualmente os únicos assalariados são os funcionários da prefeitura e aposentados. O prefeito, analista de sistemas aposentado, informatizou (com linux e open office) e implantou redes wireless para atender a todo o processo administrativo da cidade.

Agora ele quer doações de velhos computadores para colocar Solenopoles no circuito do mercado de "call-centers", tranformando a cidade em polo de empregos de TI no sertão cearense(!). O prefeito fez questão de destacar que a única circunstância que ainda o obriga a utilizar softwares proprietários em Solenopoles é a conexão com sistemas do governo federal, como o Datasus, etc.

Como diz Amadeu: "isto é que é reserva de mercado". Mas vai acabar.

Em tempo: O prof. Wagner Meira (UFMG) "castigou" o tal estudo da USP que aponta que o Windows seria 11.2% mais barato que o software livre em termos de TCO (Total Cost of Ownership). Foi demonstrado que a USP tem um "dever de casa" a fazer em relação ao tal estudo.